Hoje publicamos mais uma contribuição da nossa colunista Adriana Baggio, que fala sobre o número recorde de violação de medidas protetivas para mulheres vítimas de violência em Curitiba. É com ela:
Isolamento, recolhimento, silêncio. No início da pandemia, as medidas que obrigaram ou permitiram a muitos de nós ficar em “quarentena” foram vistas, eventualmente, de um jeito positivo.
- Mais de um ano depois, sabemos que pouquíssimas pessoas conseguiram tirar disso um benefício. Há os que não puderam ficar em casa, e que adoeceram e morreram. (Bem Paraná) E há aquelas que foram obrigadas a se confinar com um agressor, tornando-se ainda mais vulneráveis à violência e ao feminicídio.
🚨 Nem mesmo estar afastada do agressor, porém, é garantia para a segurança das mulheres curitibanas durante a pandemia. Em 2020, a Guarda Municipal registrou um recorde de casos de violação de medidas protetivas em relação ao ano anterior. Neste ano, os números continuam no mesmo ritmo acelerado.
- O que é: a violação de medida protetiva é quando um homem, proibido por lei de se aproximar ou de contatar a mulher que havia agredido, descumpre essa proibição. Na prática, representa um dos últimos degraus na escala da violência contra a mulher, depois que ela já sofreu uma agressão ou ameaça e procurou ajuda na justiça.
Dezembro é o mês em que tradicionalmente se observa um aumento dessas ocorrências, segundo a base de dados da Guarda Municipal de Curitiba. Em 2020, no entanto, tivemos quatro “dezembros”: abril, outubro, novembro e dezembro — meses com 80 ou mais violações. Março de 2021 chegou perto, com 78 casos.

Marcado pela pandemia, 2020 foi o pior ano em violação de medidas protetivas à mulher em Curitiba. Veja o gráfico completo aqui.
Quando se considera a distribuição dos casos por bairro, vemos que 2020 trouxe mais registros para locais com menos ocorrências em 2019, a exemplo do Vista Alegre e do Jardim das Américas, “democratizando” a violência contra a mulher. (O Expresso)
💭 Quando os dados sobre o aumento das violações foram divulgados, a Prefeitura de Curitiba classificou o problema como um aspecto cultural arraigado em nossa sociedade, que teria sido exposto pela pandemia. (Prefeitura de Curitiba)
- Vale lembrar, porém, que a atenção destinada pelo Palácio 29 de Março às políticas de enfrentamento à violência contra a mulher seria um importante contraponto a essa cultura. No entanto, alocar essas decisões em uma pasta de defesa social e trânsito não demonstra tal atenção. Além disso, programas de apoio a quem ficou sem renda e aos cidadãos mais vulneráveis poderiam minimizar bastante o problema, mas esses são pontos que vêm sendo bastante criticados na gestão municipal durante a pandemia. (UOL)
A nossa “cultura arraigada” interfere sim na violência contra a mulher, e não é pouco. Mas não se pode transferir a ela a total responsabilidade quando, na prática, vemos um desfinanciamento da proteção às mulheres – justamente quando a violência e a pobreza mais as têm afetado. (Think Olga)